Agenda 2030: Transporte Multimodal é tema de estudo pela ANTAQ
B24 | Seção: REGULATÓRIO | Página nº 6
No Brasil, historicamente, o regime logístico de transporte de cargas almeja o alcance de maior produtividade na movimentação e circulação de bens, reduzindo custos e aumentando índices de eficiência.
Sob tal viés, a Lei nº. 9.611, de 19 de fevereiro de 1998 e o Decreto nº. 3.411, de 12 de abril de 2000, determinaram a implementação do transporte multimodal de cargas no território nacional - caracterizado pelo deslocamento de cargas realizado por duas ou mais modalidades de transporte sob responsabilidade única de um Operador de Transporte Multimodal (OTM), negócio jurídico regido por um único contrato.
Em que pese a existência de uma demanda normativa pela multimodalidade, fato é que ela encontra ainda muita dificuldade em se concretizar em nosso país. Por este motivo, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) para somar esforços, realizando estudos focais para identificar problemas e indicar possíveis soluções para essa questão.
Em escala geral, a ANTAQ apontou que os gargalos na infraestrutura viária brasileira, além de outras questões de cunho operacional, tributário e burocrático, ocasionam dificuldades práticas e jurídicas que, por vezes, inviabilizam o aproveitamento dos benefícios do transporte multimodal.
Foi considerada, nessa perspectiva, a auditoria operacional realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que teve como propósito apontar os principais problemas que atingem a implementação da multimodalidade.
Dentre os achados, merecem destaque: (i) a governança para estruturar a política pública de integração dos modos de transporte avançou em 2019; (ii) as fragilidades encontradas na elaboração do Plano Nacional de Logística (PNL) e dos planos setoriais, bem como a falta de articulação entre os órgãos responsáveis, prejudicam a integração multimodal; e (iii) o excesso de burocracia cria desincentivos ao uso integrado dos modos de transporte.
Destarte, sugeriu-se que o Ministério da Infraestrutura (MInfra), em conjunto com a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), deve tomar as providências necessárias à contemplação da navegação interior e de cabotagem pelo documento de planejamento, de forma que o instrumento se torne, de fato, um plano de integração modal.
Nesse espectro regulatório, em observância às previsões da BR do Mar, o MInfra deve definir elementos e diretrizes a serem considerados pela próxima versão do PNL - o que leva o incentivo proposto a novos operadores no modal aquaviário, movimento que aumenta a concorrência do setor e reduz os custos dos fretes de operações. Além disso, hão de ser conhecidos os impactos de trechos ferroviários específicos, com a alteração de seu marco regulatório, flexibilizando, uma vez mais, a entrada de operadores privados na integração multimodal.
Outro importante ponto relatado pela ANTAQ, em referência à Auditoria do TCU, é a burocracia como principal complicador da multimodalidade de transportes. Isto porque, nas operações multimodais, as obrigações do transportador se multiplicam com o preenchimento redundante de dados em diversos sistemas (Nota Fiscal Eletrônica, Conhecimento de Transporte Eletrônico, Mercante, Siscarga, Porto sem Papel) e com a obrigatoriedade do porte de inúmeros documentos relativos à carga - os quais têm correspondentes digitais.
Com isso, a falta de complementaridade entre demandas regulatórias e os diferentes modais redunda na lentidão da fiscalização aduaneira e entraves procedimentais que culminam no atraso de entregas, impactando diretamente os custos das operações.
A tributação do transporte multimodal também permeou a discussão, dada a existência de conflitos de ordem fiscal e tributária referentes à correta aplicação das normas que versam sobre a multimodalidade. Nesse sentido, o estudo da ANTAQ evidenciou que a Lei n°. 9.611/1998 é pródiga em harmonizar entendimentos e prerrogativas arrecadatórias no que diz respeito à cobrança de tributos - em parte devido à assimetria fiscal entre a União e os demais entes federativos com a sobreposição de competências fiscais.
Como resultado, teve início entre os agentes do setor um amplo debate sobre a hipótese de bitributação, sobretudo quanto ao ICMS e ao ISS. De um lado, há a corrente que acredita em sua ocorrência, uma vez que os serviços de competência tributária dos Municípios estão embutidos no valor do contrato do OTM (caso em que existe a tributação pelo ISS e das demais atividades como decorrência dos serviços de transporte). Em contrapartida, há quem discorde sob o fundamento de que o fato gerador do ISS e do ICMS são distintos entre si - respectivamente, relacionam-se a serviços do transporte multimodal e a serviços de transporte propriamente dito.
Apesar das limitações impostas pela operacionalização imperfeita, a multimodalidade foi capaz de conquistar espaço no regime logístico brasileiro, mormente com as empresas de navegação, responsáveis por grande parte das importações e exportações do país. O relatório final do estudo foi aprovado pela Diretoria Colegiada da ANTAQ, dando por cumprido o item P6 da Agenda Plurianual da Autarquia, aprovada pelo do Acórdão nº. 392/2021/ANTAQ.
Para a ANTAQ, o aprimoramento da integração multimodal parte do princípio de que se faz necessária a ampliação e a melhoria da infraestrutura que assiste os agentes de carga. Associado a isso, o ganho de escala e de eficiência precisa atender às expectativas de pequenas e médias empresas, que hoje estão alijadas do transporte multimodal como solução logística.
Para além disso, aponta a Agência que a multimodalidade precisa conectar os modais de menor capacidade com os de grande capacidade, como, por exemplo, o marítimo. Na mesma toada, os aspectos fiscais e burocráticos devem considerar as demandas específicas do agronegócio, ao passo que cargas de grãos vêm dominando o cenário logístico. Aproveitando-se da natureza multimodal, as indústrias de pequeno e médio porte também precisam ter acesso estimulado, facilitado e, então, garantido ao sistema operacional.
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