A Lei nº 13.709, publicada em 14 de agosto de 2018, conta com “vacacio legis” de 24 meses o que, a princípio, determina sua entrada em vigor em agosto de 2020, ou seja, já estaria em vigor atualmente. Houve, todavia, muita discussão a respeito do início de sua vigência.
Assim sendo, iniciamos nossas considerações com o seguinte questionamento: qual seria o cerne de toda essa discussão? Podemos apontar como motivo principal a não implementação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ou ainda, a excessiva lentidão desse processo – o que determinaria a dificuldade na aplicação das multas previstas pelo descumprimento das disposições da LGPD, que podem atingir valores muito altos.
Consoante referido anteriormente, a efetividade e eficácia da Lei Geral de Proteção de Dados dependem, sobremaneira, da criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, órgão regulamentado pela Lei nº 13.853/19, de extrema importância no cenário da fiscalização do cumprimento das disposições legais.
Nesse cenário de indefinição, surgiu o Projeto de Lei nº 5.762/19, apresentado na Câmara dos Deputados em 30/10/2019, que pretendia a alteração do inciso II, do artigo 65, da Lei nº 13.709/18, para determinar, de maneira expressa, a data de 15 de agosto de 2022, como início da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados.
A principal justificativa desse projeto de lei apontava no sentido de que a maior parte das empresas brasileiras ainda não estaria adaptada às previsões legais em agosto de 2020. Outrossim, há referência à morosidade na instalação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, o que, conforme já ressaltado, dificultaria o controle da observação, ou não, das disposições legais por parte das empresas.
O projeto de lei em comento está, no presente momento, aguardando parecer do relator, Dep. Eduardo Bismarck (PDT-CE), na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). Pelo que se pode concluir, dos fatos que ainda serão expostos neste excerto, perderá o objeto, sem que seja analisado e julgado pelo Congresso Nacional.
Pois bem.
Não bastasse toda a problemática já existente, desde meados de março de 2020, o país –e o mundo – enfrenta crise econômica, social e de saúde pública gerada pela pandemia COVID, que levou à paralisação – ou à lentidão extrema – de vários setores da sociedade, em face das quarentenas legais, por um período que, ao que parece, deverá se estender por mais alguns meses, a despeito da retomada gradual dos serviços, pela qual passamos no momento.
Foi apresentado, então, pelo Senador Antonio Anastasia (PSD/MG), o Projeto de Lei nº 1.179/2020, que não tratava especificamente da Lei Geral de Proteção de Dados, como o anteriormente analisado, mas trazia previsões a respeito da prorrogação de sua vigência, para 2021. Os artigos 52 a 54 da LGPD, referentes às sanções aplicadas pelo descumprimento das determinações legais, entrariam em vigor apenas em agosto de 2021, enquanto que os demais artigos estariam vigentes a partir de janeiro de 2021.
Votado na Câmara e no Senado, o projeto de lei sofreu alteração em sua redação original, tendo sido parcialmente vetadas as alterações relativas à entrada em vigor das disposições da LGPD. Manteve-se, apenas, a alteração quanto à vigência dos artigos 52, 53 e 54 da Lei, que deverão vigorar a partir de 1º de agosto de 2021, apenas.
O projeto de lei recebeu sanção presidencial, tendo sido convertido na Lei nº 14.010, publicada em 10 de junho de 2020.
Há que se considerar, ainda, dentro do panorama pandêmico ora enfrentado, a edição da Medida Provisória nº 959/2020, em 29 de abril de 2020, que determina a alteração do inciso II do artigo 65 da Lei nº 13.709/18, prorrogando a vigência da LGPD para 03 de maio de 2021.
Em parecer preliminar, apresentado na data de 05/08/2020, na Câmara dos Deputados, o relator, Deputado Damião Feliciano (PDT/PB), entendeu que o artigo 4º da Medida Provisória nº 959 não deveria passar por votação na Casa, sob fundamento de que necessário garantir estabilidade ao ecossistema de proteção de dados, o que determinaria a entrada em vigor da LGPD, nos termos em que prevista inicialmente, em agosto de 2020.
A votação da MP, iniciada em 25/08/2020, pela Câmara dos Deputados, determinou-se a alteração do artigo 4º, anteriormente citado, postergando a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados para o dia 31/12/2020.
A discussão seguiu para o Senado e, no dia 26/08/2020, os integrantes da Casa entenderam pela não votação do dispositivo da Medida Provisória nº 959, que alterava a vigência da LGPD para 2021, em face da anterior análise da questão, quando da votação do Projeto de Lei nº 1.179/20, convertido na Lei nº 14.010/2020, em que houve consenso no sentido de somente alterar a vigência da lei em relação às penalidades impostas.
Importa atentar, ainda, que, por meio do Decreto nº 10.474, de 26/08/2020, foi aprovada a estrutura regimental e de cargos, para a criação da ANPD. Nos termos do artigo 1º, do Anexo I, o referido Decreto define o seguinte: “A Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD, órgão integrante da Presidência da República, dotada de autonomia técnica e decisória, com jurisdição no território nacional e com sede e foro no Distrito Federal, tem o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, orientada pelo disposto na Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.”
Seria possível, então, responder o questionamento que dá título ao presente artigo? De maneira peremptória, ainda não.
Em que pese já termos conhecimento do fato de que o dispositivo da Medida Provisória nº 959, que postergava a vigência da maioria dos artigos da LGPD para maio de 2020, não constará do texto da lei decorrente da conversão da MP, remanescem dúvidas a respeito de sua entrada em vigor.
Não há consenso de entendimento, uma vez que existem posicionamentos diversos sobre a situação: uma vertente aponta no sentido de que os artigos da LGPD estariam, já agora, em vigor, tendo em vista a perda de eficácia da Medida Provisória, em 26/08/2020; enquanto que, contrariamente, há quem entenda que a LGPD somente passaria a viger após a publicação da lei originada a partir da MP 959, sem a referência ao seu artigo 4º. Ainda podemos citar o debate acerca da retroação da vigência da LGPD, à sua data original, após publicada a lei derivada da MP 959.
Nosso posicionamento, no entanto, mantém-se o mesmo: as empresas devem estar preparadas, imediatamente, para cumprir as disposições legais acerca da proteção de dados.