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Conservação de dados no pós contrato: limites temporal e material

Atualizado: 21 de nov. de 2022


A Lei 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção de dados, inspirada na legislação europeia General Data Protection Regulation (GDPR), veio de forma revolucionária a regulamentar o tratamento de dados pessoais (inclusive nos meios digitais), com o propósito protetivo dos direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e sobre o desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.

Em que pese a lei não ter trazido em seu bojo previsões específicas - ao contrário da legislação europeia na qual se inspirou - é evidente que suas disposições também alcançam as relações de trabalho, provocando a necessidade de adaptação das empresas, inclusive no que se refere ao tratamento de dados pessoais de trabalhadores na fase pós-contratual.

Antes de adentrarmos propriamente na celeuma que nos dispusemos a tratar neste despretensioso estudo, necessário tecermos breves noções sobre alguns dos dados abarcados pela legislação.

Nos termos do artigo 5º, I, são considerados dados pessoais as informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável. O inciso II elenca como dado pessoal sensível informações sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando relativos à pessoa natural.

As hipóteses permissivas de tratamento de dados estão elencadas no artigo 7º (dados pessoais) e artigo 11 (dados sensíveis), e abarcam desde o consentimento do titular até o atendimento a obrigações legais, passando pelo exercício regular de direito em processos administrativos, judiciais e arbitrais.

Feitas essas considerações, há de se levar em conta que após o encerramento do pacto laboral remanescem para a empresa obrigações legais quanto a transmissão de informações relacionadas ao empregado, bem como para o potencial exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo e arbitral, hipóteses em que entendemos ser dispensado o consentimento do titular tanto para o tratamento de dados pessoais quanto para tratamento de dados sensíveis.

Todavia, o questionamento que surge quando pensamos nas hipóteses aventadas no parágrafo acima é: qual o limite temporal para a empresa manter o tratamento de tais dados?

Em relação às obrigações legais de transmissão de dados do empregado no pós contrato não vislumbramos maiores elucubrações, haja vista que o empregador, nos termos do artigo 477, § 6o da CLT, deverá comunicar a dispensa do empregado aos órgãos competentes, bem como entregar ao empregado os documentos que comprovem tal comunicação no prazo de 10 (dez) dias a partir do término do contrato de trabalho.

No que se refere ao exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo e arbitral, a resposta se mostra mais nebulosa.

Há quem defenda que a prescrição trabalhista deverá ser observada para fins de parâmetro.

Nessa toada, o artigo 7º, inciso XXIX da Constituição Federal, estabelece que o direito de ação prescreve em dois anos após término do contrato de trabalho, podendo os empregados urbanos e rurais pleitear os créditos resultantes das relações de emprego atinentes aos últimos cinco anos da data do ajuizamento da ação.

Entretanto, há hipóteses, entre outras, em que o início da contagem do prazo prescricional não necessariamente coincide com a ruptura do contrato de trabalho. É o que se observa, por exemplo, no tocante a pedidos de reparação por danos materiais, morais e estéticos oriundos de acidentes de trabalho ou doenças profissionais.

Em um primeiro momento, temos duas situações em que aplicadas a prescrição civil, que no código de 1916 era de 20 (vinte) anos e, a partir da vigência em 11.01.2003 do Código Civil de 2002, passou a ser de 03 (três) anos.

Ante a diminuição abrupta do prazo de 20 (vinte) anos para 03 (três) anos surgiu uma terceira situação. O artigo 2.028 do novo Código Civil fixou a seguinte regra de transição: se transcorrido mais da metade do prazo prescricional de 20 anos, aplica-se a prescrição do Código Civil de 2016.

Se a lesão tivesse ocorrido há menos de dez anos, aplica-se a prescrição do novo código.

Finalmente, a partir da Emenda Constitucional 45/2004, que atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar os casos de dano moral decorrentes das relações de trabalho, começou-se a aplicar a prescrição trabalhista do artigo 7º, XXIX da CF.

Não obstante, ainda se tem problemática relacionada à fixação do marco inicial de fluência do prazo prescricional destas ações, cuja solução se dá pela aplicação do princípio da actio nata, consagrada na Súmula 278 do C. STJ, que estabelece como termo inicial a data em que o empregado obtém a ciência inequívoca da incapacidade laboral, ou seja, dos efeitos gerados pelo acidente de trabalho.

Evidenciando algumas das possibilidades prescricionais abordadas acima, a 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho afastou a prescrição de uma ação ajuizada após 18 anos do término do contrato de trabalho. A dispensa do trabalhador ocorreu em 1991 e a ação pleiteando indenização por danos morais e materiais em razão de doença do trabalho fora ajuizada somente em 2009. As instâncias inferiores haviam aplicado a prescrição bienal do artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição da República, mas o TST entendeu que no caso, deveria ser aplicada a regra de transição do artigo 2.028 do Código Civil e a prescrição a ser aplicada para o caso era a de 20 (vinte) anos, prevista no artigo 117 do Código Civil de 1916. Foi ainda observado pela Turma que a prescrição trabalhista somente é aplicável se a ciência da lesão se dá depois da vigência da EC 45/2004. (Processo TST-RR-80940-06.2009.5.02.0082).

Em outra ação, o TST manteve o entendimento do TRT da 9ª Região que afastou a prescrição da ação ajuizada 24 anos após acidente de trabalho. Nesse caso, a Turma aplica o prazo estabelecido no Código Civil de 1916, e que só começa a fluir a partir do momento em que o trabalhador atingiu a maioridade, nos termos do artigo 402 da CLT. Com isso, declarou que a ação, ajuizada em janeiro de 2004, estava dentro do prazo, uma vez que a prescrição apenas se daria em março do mesmo ano, data do vigésimo aniversário da maioridade do empregado. O relator do recurso asseverou que não corre nenhum prazo prescricional contra menores de 18 anos, nos termos do artigo 440 da CLT. (Processo TST-RR- 9954400-02.2006.5.09.0096)

Vale citarmos, ainda, casos de suspensão e interrupção do prazo prescricional, assim como situações em que não corre prescrição, como nos casos envolvendo absolutamente incapazes.

Conforme demonstrado, não basta se considerar o prazo estabelecido no artigo 7º, XXIX da CF, fazendo-se imprescindível o elastecimento do tratamento dos dados no pós contrato pelo maior lapso temporal possível.

Esse artigo foi originalmente publicado na Revista Digital Direito do Trabalho em Foco - 4a. Edição. Clique aqui para acessar o conteúdo completo, que apresenta outros artigos elaborados por especialistas da RMM sobre os aspectos trabalhistas da LGPD.

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