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Retenção de carga

Atualizado: 21 de nov. de 2022

Há algum tempo o abandono de cargas nos portos brasileiros vêm trazendo significativos prejuízos aos principais atores das operações portuárias: terminais e transportadores marítimos. Neste ano de recessão, o problema só se agravou.

Os terminais ficam com os seus pátios congestionados e vêm sua receita despencar, ao passo que as companhias marítimas têm seus contêineres paralisados e ficam impossibilitadas de atender a outros clientes. Em que pese os esforços das respectivas Alfândegas, com destaque para a do Porto de Santos que têm promovido leilões mensais, o procedimento é deveras moroso e não acompanha o volume de carga apreendidas ou abandonadas.

O assunto foi parar nos Tribunais. As companhias marítimas solicitam ao Poder Judiciário que ordene aos terminais desovarem as mercadorias e entregarem os cofres de cargas, pois entendem que o contrato de transporte se consuma com a descarga no Porto. Os terminais, por sua vez

Crise mundial, desemprego, xenofobismo, protecionismo, migração, países emergentes... Quem imaginou que a crise financeira mundial que assolou o mundo em setembro de 2008 pudesse provocar efeitos tão profundos no processo de globalização? Quem imaginou que famílias de “uma hora para outra” abandonariam o sonho de viver nos países desenvolvidos para retornar à sua terra natal atrás de empregos que por lá não existem mais? E o que isso provocou no Direito marítimo e portuário?

O Direito vive, depende e se desenvolve a partir do fato econômico. Em nossa seara marítimo-portuária, o fato econômico acima descrito gerou, ou melhor, desencadeou uma discussão antiga e deveras interessante.

Recentemente, foi objeto de notícia no tradicional programa dominical “Fantástico” os problemas gerados no Porto de Santos com bagagens retidas pela autoridade aduaneira. O assunto foi abordado 15 dias depois em matéria jornalística em A Tribuna (16/6/09). Antes, porém, o assunto já estava nas barras do Tribunal, objeto de disputa pela liberação destas “mercadorias” com transportadores e agentes de carga.

Em que pese a bagagem não ser mercadoria, está a esta equiparada para efeito e análise do direito de retenção, com uma significativa diferença na relação comercial entre o seu proprietário e o transportador marítimo e/ou NVOCC. Trata-se da única relação na seara marítimo-portuária onde se faz incidir as regras do Código de Defesa do Consumidor.

Pois bem. É assente na jurisprudência dos Tribunais de Justiça, com destaque para o TJSP, que a mercadoria só pode ser retida pelo transportador marítimo em razão do frete e avaria grossa, a teor do disposto no artigo 7º do Decreto-lei n. 166/67.

Ocorre que, receosos com o não pagamento da demurrage, os transportadores passaram a exigir dos proprietários da bagagem uma caução (depósito em dinheiro) para a liberação do conhecimento marítimo. Some-se a isto a permissão no direito estrangeiro do emitente do B/L retê-lo a pretexto de outras dívidas que não o frete.

A retenção do B/L nestas circunstâncias é para a legislação brasileira ILEGAL e acarreta um problema econômico: agrava a situação e, por vezes, torna insolúvel a questão. Isto porque a retenção da bagagem, conseqüência da não liberação do B/L, aumenta a própria despesa de sobreestadia, onera o custo da armazenagem portuária e, dependendo do prazo para esta solução, gera a apreensão aduaneira por suposto “abandono”.

Para o direito comercial marítimo brasileiro, a emissão de um conhecimento marítimo prepaid é suficiente para a obrigação do transportador e/ou seu agente autorizar a sua liberação para fins de desembaraço aduaneiro. Nesta hipótese, em que pese o justificado receio da inadimplência, a retenção é ilegal e acarreta para o transportador o ônus de arcar com todos os prejuízos dela decorrentes, destacadamente, a armazenagem portuária. Registre-se inclusive que os terminais portuários gozam, em nossa legislação, do legítimo direito de retenção para o recebimento dos custos de armazenagem.

Em recente decisão, um dos magistrados da Comarca de Santos invocou o direito à dignidade da pessoa humana, de ofício, em abono à liberação do B/L e fixação da multa cominatória, classificando como “direito essencial” a disponibilidade dos próprios bens.

O tema está em nossas Cortes e reflete uma disputa econômica trazida com o fluxo migratório oriunda da crise financeira mundial.

Thiago T. M. Miller, advogado, sócio da Advocacia Ruy de Mello Miller, especializada em Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro. www.miller.adv.br

- Transferência de ônus do transportador marítimo aos terminais portuários e retroportuários.

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